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Diário de Bordo 25 – Estados Unidos 1

(13/05/2015 a 14/06/2015)

“Ir aos Estados Unidos de carro!”, não parece algo pelo mínimo desafiador?

Não dizemos isso pelos quilômetros que nos separam, mas pelas distâncias em nossas realidades. UAU, estamos falando de Estados Unidos da América, um dos gigantes do planeta. Maior economia do mundo; maior potência militar, sendo o primeiro país a utilizar armas nucleares em guerras; detém um dos mais altos níveis de desenvolvimento e produtividade; é líder em pesquisa científica e em inovação tecnológica e, convenhamos, os 50 estados unidos que formam este país são quem ditam grande parte das regras mundiais, seja lá no que for, economia, política ou cultura. Mas se essas regras se proliferassem apenas por persuasão, tudo bem, porém os seguintes números mostram que não: entre os anos 1890 e 2012, os Estados Unidos invadiram ou bombardearam outras 149 nações ao redor do mundo. Quando falamos aos americanos sobre nossa viagem, que envolve provavelmente muitos desses países bombardeados por eles, de pronto nos dizem que não poderiam fazer igual, pois seus passaportes não seriam bem vindos por lá.

Mas quem diria, nosso querido Lobo da Estrada nos trouxe a terra do Tio Sam. O que já fizemos no passado em 7 horas apenas, voando, levamos agora mais de 6.000. E ao invés de entrar por seus aeroportos internacionais de Miami, Nova Iorque ou Los Angeles, dessa vez entramos por Lukeville, alguém já ouviu falar? É uma minúscula vila localizada na fronteira com o México e por ser pouco movimentada, cruza-la foi tranquilo demais – nosso carro sequer foi registrado no país. Os americanos estão mais preocupados com nós, pessoas, pois a imigração ilegal é um problema alarmante. De uma forma simpática, o oficial de fronteira sondou nossas vidas e nossos interesses dentro de seu país. Eles são muito bem treinados para fazer-nos falar mais do que devemos, se é que tivéssemos pretensão de algo a mais que o turismo.

Quando fomos liberados com 6 meses de visto, seguimos viagem ao norte, dirigindo ainda muitos quilômetros pelo exótico deserto de Sonora. Esse deserto, no lado americano próximo a fronteira é protegido pelo parque nacional Organ Pipe Cactus National Monument. Aí passamos por Phoenix, capital do Arizona e fomos a Flagstaff (Mormon Lake), onde começaria no outro dia a Overland Expo 2015, a tal feira de Overland e 4×4 que nos propusemos a participar.

Muitos amigos brasileiros já estavam lá! Liene, Dan, Paula, Renan, Rosely, Amabry, Xixo, Fran e Bárbara. Nós só não esperávamos uma mudança climática tão drástica. O tempo fechou, começou a ventar e a expectativa era que cairia neve nas próximas horas. Essa era nova para nós – neve no Arizona, em maio!!! E não deu outra… nevou muito. O lugar destinado para as pessoas acamparem virou uma lama que carros 4×4 encalhavam a toda hora. Mas isso dava para entender, pois estava difícil até de caminhar. Em uma das noites, já que estávamos acampados junto aos amigos brasileiros, entramos em 9 dentro do Lobo para jantarmos. Só assim para fugir do frio. E como foi divertido!!!

A feira, mesmo com toda aquela lama e frio, foi muito legal. Mas começamos a aproveita-la somente no sábado, quando o mau tempo deu uma trégua. Nosso intuito era conhecer outros viajantes, fazer contatos, participar de algumas palestras, buscar informações, ver equipamentos, etc. Para o último item estávamos no paraíso. Nós costumamos brincar que os americanos são os maiores inventores do mundo. Onde quer que você vá, encontrará soluções para todas as suas necessidades e outras que você jamais pensou que pudessem existir. Uma curiosidade do mundo da invenção: Albert Einstein não nasceu nessas terras, mas mudou-se para os Estados Unidos na década de 1930. Quem sabe ele despertou nos americanos o gosto pela invenção.

No sábado a noite encontramos com Felipe, Viviane, Ivy e Lucca, nossos amigos de Curitiba – PR que vieram passar as férias nos EUA. Planejávamos passar alguns dias juntos, então no domingo, depois de caminharmos mais um pouco pela feira e vermos alguns luxuosos motorhomes 4×4 Earth Roamers, coisa de 500 mil dólares, pegamos nossos modestos carros (a família Schultz com seu motorhome alugado) e viajamos até o Monument Valley, uma região situada na reserva dos índios Navajos, entre os estados Arizona e Utah. Como é um lugar desértico e lindíssimo, com formações rochosas que brotam do chão e sobem até 300 metros de altura, foi cenário de muitos filmes westerns, particularmente os que tinham como artista principal John Wayne. Vejam nossas fotos – impossível que você não tenha visto este lugar em algum cartão postal, calendário, cenário de filme ou outro. Para nós foi uma alegria passar esses dias com os nossos amigos de casa. Quebrou um pouco a nossa rotina e, talvez pela sede de contar histórias, fez com que aquele líquido amarelado que vem dentro das garrafas de whisky simplesmente desaparecesse.

Depois do terceiro dia, já sentindo saudades, nos despedimos depois do café da manhã. Felipe e família seguiram para o oeste e nós para o norte, para um estado americano que, por sua beleza, há muito tempo nos chamava – Utah. O estado todo é desértico e ambos adoramos deserto. Tudo é grande a perder de vista e quando a gente se desloca por alguns quilômetros em qualquer direção, a natureza muda violentamente. Moab, cidade situada ao meio de toda essa natureza de rocha avermelhada, respira aventura e esportes ao ar livre.

Nós estávamos com uma lista de parques nacionais que queríamos conhecer em Utah. E quando entrávamos no primeiro, alguém bate em nossa janela. Caramba, que susto!!! Era o João Vitor, amigo brasileiro que conhecemos na Bahia há alguns anos e que também é paraquedista. Ele sabia de nossa viagem, mas não acreditou quando viu o Lobo da Estrada aguardando na fila de entrada do parque. Largou seu carro no acostamento e foi lá nos cumprimentar. Pura coincidência e isso foi muito legal, pois nas noites que estivemos em Moab, acabamos nos encontrando para jogar conversa fora. Nessa cidade também fomos convidados para um belo churrasco por duas famílias de americanos de Nebraska que estavam passando férias por ali.

Fomos primeiro no Parque Nacional dos Arcos, que como seu nome diz, caracteriza-se pelos arcos naturais esculpidos em rocha avermelhada (arenito) pela ação do tempo. Era difícil seguir em frente pela estrada do parque de tantas paradas que fizemos para admirar e fotografar aquele espetáculo. Só de arcos naturais há mais de 2.000.

Para o segundo parque nacional recebemos a melhor dica – dirigir por uma trilha chamada Schaffer Trail, que adentra o Canyonlands pela porta dos fundos. Primeiro margeamos paredões do Rio Colorado e depois entramos na parte baixa do cânion até subi-lo por completo. O Canyonlands National Park (A Terra dos Cânions) possui uma característica diferenciada – formam-se ali dois patamares de cânions. Deixa-nos tentar explicar: a parte mais alta é plana e tem um formato triangular que acaba quando o cânion da esquerda encontra o cânion da direita. Dentro da parte baixa do cânion da esquerda, que foi por onde viemos na Shaffer Trail, há o rio Colorado que cava um segundo nível de cânion. Lá no lado direito acontece a mesma coisa, mas com o Rio Verde cavando um segundo cânion. Resumindo, é animal!!! Já ao lado do Canyonlands situa-se o Parque Estadual Dead Horse de onde se tem uma vista maravilhosa de uma curva do Rio Colorado. De tão acentuada a curva, o rio quase volta para o lugar de onde veio!

O estado de Utah tem uma característica interessante no que tange a religião. É o centro de influência da cultura mórmon e mais de 60% da população deste estado é membro de uma organização dos Santos dos Últimos Dias, nome que os mórmons se auto denominam. Quando viajávamos entre esses parques maravilhosos, de vez em quando víamos monumentos e implementos agrícolas antigos que são preservados e contam um pouco da história dos colonizadores mórmons, que se mudaram para este estado em busca de liberdade religiosa.

Mais alguns quilômetros para oeste e veio o Bryce Canyon e o Zion National Parks. Ambos são lindíssimos, mas completamente diferentes. No Bryce, devido a ação da água e do gelo na encosta de um platô de solo calcário, formou-se um labirinto de erosões gigantes. Elas se estendem vale abaixo, onde é possível fazer longas caminhadas por entre torres e paredões de rochas avermelhadas esculpidos pela erosão. As vistas dos diversos mirantes, da encosta do platô, são de cair o queixo. Dá para passar horas ali quebrando a cabeça para entender como tudo aquilo se formou.

O Zion National Park é uma junção tipo “T” de dois cânions gigantes. Nós entramos pela parte alta e logo descemos para o vale, que é de onde partem a maioria dos passeios e caminhadas. Aliás, em todos os parques americanos, quem gosta de caminhar provavelmente não ficaria frustrado, pois há trilhas de todos os níveis. Nós não planejávamos ir muito longe naquele dia, queríamos apenas desvendar um pouco das belezas da parte baixa do cânion. Sabíamos de uma trilha longa que faz um zig-zag acentuado no paredão de uma encosta e, após uns 6km de caminhada por trilhas curtas, falamos, – “ah, vamos só até aquele zig-zag dar uma olhada e tirar uma foto, não precisamos subir.” Chegando lá não resistimos e decidimos subir, pois a vista lá de cima deveria ser linda. Aquela era a trilha do Angels Landing Point (ponto de pouso dos anjos), uma das caminhadas mais famosas do Zion e por isso, talvez fosse uma das mais bonitas. Fazia muito calor naquele dia e nós não havíamos levado água suficiente para uma caminhada tão longa. Depois de ter superado o primeiro zig-zag e ter tido uma vista panorâmica do cânion, continuamos a caminhada com aquele pensamento: vamos só mais um pouco!, e de repente não queríamos mais desistir de chegar no topo, que estava a quase 500m acima do vale. Agora sério, essa foi uma das caminhadas mais alucinantes que fizemos até hoje. Primeiro sobe-se naquele zig-zag no paredão do cânion. Depois, por uns bons quilômetros entra-se por uma espécie de fenda entre duas montanhas. Quando se está lá no fundo, começa-se realmente uma subida longa e íngreme em zig-zag novamente. E quando se chega lá em cima, vê-se que ainda há uma subida muito grande pela frente num trajeto mais técnico, com pedras soltas e precipícios de mais de 400 metros para os dois lados da montanha. Chegar ao ponto final é realmente chegar na terra de anjos. Ter todo aquele vale a nossos pés dá asas a nossa imaginação e a vontade era de sair voando por ali. Voltar não foi uma tarefa fácil para as nossas pernas que já estavam tremendo quando chegamos ao vale novamente. A alegria maior foi encontrar uma torneira com bastante água para matar a nossa sede.

As belezas naturais não acabaram por ali, continuaram quando voltamos ao estado do Arizona e conhecemos mais dois cânions: um pequeno e estreito, chamado Antilope Canyon e um gigantesco, que talvez seja um dos lugares mais visitados dos Estados Unidos, o Grand Canyon.

O Antilope Canyon é um lugar místico. Possui menos que 40 metros de profundidade e sua largura, em alguns pontos, dá passagem somente para uma pessoa. O arenito avermelhado de suas paredes é cuidadosamente esculpido pelas chuvas torrenciais, que desgastam com mais facilidade as partes moles da rocha, deixando mais expostas as partes duras. As formações se parecem com ondas e elas são iluminadas por apenas alguns raios de sol que conseguem penetrar na fenda. Nós tivemos a oportunidade de estar lá dentro, caminhar por entre a fenda e pirar com tamanha ousadia da natureza.

Mas o que falar do Grand Canyon? Puxa, é preciso pensar muito para conseguir descrever este lugar sem desmerece-lo. A começar pelo tamanho – GIGANTE para todos os lados. Seu comprimento é de 446km, sua parte mais larga tem 29km e seu ponto de maior desnível entre o fundo e a crista ultrapassa os 1.850 metros. O responsável por este grandioso trabalho foi novamente o rio Colorado (só para relembrar, este é o mesmo rio que escavou o lado esquerdo do Canyonlands). Milhões ou até bilhões de anos foram investidos nesse processo, onde o rio e seus afluentes foram cortando camada por camada de rocha para ampliar o que é hoje o Grand Canyon. E cada camada com sua cor e dureza, o que vai dando ao cânion uma textura uniforme em toda sua extensão. É impressionante. Bom, achamos que não é preciso falar mais nada. O desafio agora é imagina-lo antes de ver as fotos, hehe!!! Detalhe: há duas possibilidades para visita-lo, o lado norte e o lado sul. O sul é mais turístico, então, para fugir da multidão, o conhecemos pela parte norte. Se é o lado mais bonito não sabemos, mas é certo que quase todos os americanos que falamos nos indicaram ir ao norte.

Depois de tantos parques visitados e de sermos presenteados com tantas belezas, o jeito para descansar do belo foi trabalhar um pouco. Fomos a Phoenix, a convite de Chad, um amigo que fizemos na Overland Expo e lá começamos a negociação para a impressão de nosso livro em inglês. Ficou melhor do que o esperado!!! Estamos muito felizes em podermos compartilhar a história de nossa primeira viagem com o mundo…

Nossa procura por belezas naturais continuou a todo vapor pelas terras do Tio Sam. Do Arizona seguimos para a Califórnia e no caminho desértico um acontecimento mexeu conosco. Mas para não deixar este diário ainda mais extenso, faremos um post sobre ele logo na sequência.

Um grande abraço e até a próxima…

Itinerário percorrido

Itinerário Estados Unidos 1

Fotos

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