ícone lista de índices Índice

Diário de Bordo 32 – Nepal 1

Diário de Bordo

(04/03/2008 a 14/03/2008)

Nepal… o teto do mundo!

Há cerca de 60 milhões de anos atrás, depois da colisão entre a placa tectônica Indo-australiana com o continente Eurasia, surgiu a Cordilheira do Himalaia. O Himalaia (hima = neve, laya = morada) é a cadeia montanhosa de maior altitude da Terra e não é por menos que nela, na fronteira entre o Nepal e o Tibete (China), se localiza a montanha mais alta do mundo, o tão conhecido Monte Everest com seus 8.848m de altitude.

Apesar de descoberto em março de 1856, as primeiras tentativas de escalada do Everest iniciaram somente na década de 20, quando atingir o topo do pico tornou-se uma febre para os ocidentais, principalmente para os britânicos. Depois de muitas tentativas, das quais muitas ultrapassaram os 8.000m de altitude, em 29 de maio de 1953 a primeira expedição chegou ao topo do mundo e foi composta pelo alpinista sherpa nepalês Tenzing Norgay e pelo apicultor neozelandês Edmund Hillary. A descoberta em 1999 do corpo do escalador britânico George Mallory, congelado perto do pico, trouxe novamente a tona um dos mistérios do montanhismo. Em 1924, Mallory e Andrew Irvine, ambos britânicos, fizeram uma tentativa de ascensão da qual jamais retornaram. Não se sabe se atingiram o pico e morreram na descida, ou se nem chegaram até ele,  já que o corpo de Mallory estava com objetos pessoais, mas sem a foto da esposa que ele prometera deixar no pico. Será que eles foram os primeiros a chegar no cume? Ninguém tem certeza, entretanto, George acabou ficando famoso por sua explicação sobre o montanhismo, onde quando questionado por que ele estava escalando o Mt. Everest, respondeu: “ Porque ele está lá!

Desde então, o pico mais alto do mundo atraiu muitas conquistas como a primeira mulher (1975), o primeiro escalador sem oxigênio (1978), a primeira ascensão solitária (1980), os primeiros brasileiros (1995), o primeiro escalador com uma perna artificial (1998), a primeira descida de ski (2000), o primeiro escalador cego (2001), a primeira brasileira (2006), o mais novo escalador (16 anos), o mais velho (64 anos), o mais rápido (8 horas) e a pessoa que ficou mais tempo no topo (o Sherpa Babu Chiru, que ficou 21 horas). Mas também aconteceram admiráveis comédias por lá, como a do britânico Maurice Wilson, o qual planejou bater seu avião na metade do pico e escalar a outra metade até o cume. E óbvio, que sem nenhuma experiência em escalada, ele morreu congelado e foi encontrado perto do acampamento 3 vestindo apenas roupas finas. Outra loucura foi realizada por um time britânico, o qual escalou todo o caminho até o acampamento base para jogar o jogo de rugby em maior altitude (5.140m). E quem ganhou o abacaxi, foi uma dupla (BRITANICOS novamente) que escalou até os 5.440m carregando um quadro de ferro só para fazer algumas piadinhas. A dupla revelou que a preparação para uma expedição pode ser limitada a três importantes fatores: algumas cervejas, uma aposta de bêbados e um quadro de ferro roubado. Cada um…

Bom, falando em Himalaia e Monte Everest já deu para perceber que estamos por aqui. Este país sempre esteve em nossos planos, mas desde que ouvimos pela primeira vez, na Austrália, que deveríamos fazer a caminha Annapurnas Trek e que esta foi, para muitos, uma das melhores coisas que já fizeram em toda a sua vida, não víamos a hora de chegar neste pais.

Os últimos dias na Índia, eram ainda 4h da tarde quando o sol deixava de brilhar, pois era tanta, mas tanta poluição que nenhum raio solar conseguia chegar até nós e parecia que o dia virava noite. Porém, o sol voltou a brilhar quando cruzamos a borda Índia/Nepal e tudo mudou rapidamente: o tumulto diminuiu, as buzinadas foram ficando cada vez mais longe, os olhinhos ficaram puxados e a tranqüilidade pairou no ar. Com um novo ânimo, pois iríamos poder dirigir em melhores condições que nas rodovias indianas, decidimos sair 22km de nossa rota e nos deslocarmos até a vila de Lumbini, o lugar histórico onde em 563a.C. nasceu Gautama Siddhartha Buddha. Este local, mesmo sendo um importante destino para os peregrinos budistas, não é nada mais do que algumas ruínas, ou melhor, pilhas de tijolos que datam de mais de 2.000 anos atrás, que hoje são rodeadas por templos e monastérios e onde pessoas do mundo inteiro vêm meditar.  Apesar de Buddha ter nascido em solo nepalês, o hinduísmo dominou o império e somente em 249a.C. é que esta religião foi introduzida pelo imperador Ashoka. Até hoje, o hinduísmo é a religião dominante no Nepal com 81% de adeptos e apenas 11% da população é budista e estes, vivem principalmente nas montanhas.

Durante os dois primeiros dias no Nepal, viajamos pela plana região chamada de Terai, que possui características geográficas e culturais semelhantes a Índia. Iniciamos nossa viagem em apenas 80m de altitude, porém, no terceiro dia, começamos a ver as primeiras montanhas da Cordilheira do Himalaia. E se estávamos somente naquela altitude e esta cordilheira possui apenas 200km de largura, vocês podem imaginar como a coisa sobe rapidamente por aqui. De 80m até 8.848m de altitude… uaw! O Terai esta repleto de rios secos, daqueles rasos, esparramados e cheios de pedra, que nos dão uma noção de quanta água desce de lá durante a época de chuvas. Dois nepaleses já nos falaram, que depois do Brasil, o Nepal é o segundo país do mundo com maior quantidade de água.

Ziguezagueamos pelas montanhas, curvas, vilas, pessoas simpáticas e terraços para a agricultura que formavam escadarias desde o topo das montanhas até os mais profundos vales que chegam em Kathmandu, capital do país. Os primeiros 3 dias ficamos estacionados no centro da cidade e os próximos quatro dias nos mudamos para uma oficina, onde fizemos uma revisão detalhada em nosso carro, além de alguns pequenos reparos. O Lobo ficou zero bala e tudo isso foi feito por uma mão-de-obra especializada e super barata.

Kathmandu parece como qualquer outra cidade em desenvolvimento: surto de construções em concreto, poluição, muitos veículos… A parte principal, conhecida por Thamel, é repleta de restaurantes, bares e lojas que vendem de tradicionais artesanatos e souvenirs a DVDs e roupas esportivas falsificadas, tudo voltado ao turismo. É muito fácil perder horas e horas, além de gastar muito dinheiro por ali, mas temos que admitir que esta parte da cidade não tem nada haver com o que é o real Nepal. Para ver a realidade, basta caminharmos um pouco para fora deste centrinho e podemos admirar diversos templos hindus, budistas e tibetanos; as construções típicas da cultura newari, que são a maioria no Vale de Kathmandu; e também ver o dia a dia dos nepaleses.

Uma das partes mais bonitas e interessantes da capital é a famosa Durbar Square, onde o rei da cidade foi coroado e legitimado há muito tempo atrás. Essa praça é até hoje o coração da cidade antiga e é um dos maiores legados de arquitetura no país. Na verdade, a Durbar Square é formada por diversos templos repletos de esculturas e detalhes em madeira. Lindíssimos! A construção que mais nos chamou a atenção foi a Kumari House.

O Nepal não possui apenas incontáveis deuses, encarnações e manifestações veneradas como estátuas, imagens, pinturas e símbolos, mas eles também possuem uma Deusa em vida. A Kumari Devi é uma jovem menina a qual acredita-se ser a encarnação da Deusa Taleju.

O processo seletivo dessa menina é extremamente rigoroso, onde ela deve ser selecionada de uma casta específica da sociedade nepalesa; geralmente, está entre 4 anos e sua puberdade; deve estar em perfeito estado de saúde; deve possuir 20 dentes; seu cabelo e olhos devem ser pretos; e ela deve possuir estritamente 32 qualidades físicas (pescoço como uma concha, cílios como de uma vaca, peito como de um leão, voz suave e clara como de um pato, etc). Seu horóscopo também deve ser apropriado. Uma vez selecionado um grupo de meninas que atendem a estas qualidades, estas são colocadas em um quarto escuro onde barulhos assustadores são feitos, enquanto um homem dança com marcaras horrorizantes. A menina que permanecer calma será a escolhida, pois essas coisas assustadoras não são capazes de amedrontar a real encarnação da Deusa. Porém, um pequeno teste ainda resta para comprovar sua legitimidade. Em um processo similar a seleção do Dalai Lama, a nova Kumari deve escolher, dentre uma infinidade de objetos, os quais pertenceram a sua antecessora.

Uma vez encontrada a menina perfeita, ela move-se para seu palácio, de onde sai somente cerca de 6 vezes ao ano e ela aparece na janela, aos seus devotos, por alguns segundos duas vezes ao dia. A Kumari possui esse status até quando ela ganha sua primeira menstruação ou caso aconteça algum acidente, onde ela perca muito sangue. Apos sua puberdade, ela volta a ser uma mera mortal e o processo de seleção começa novamente…

No dia 14 de março dirigimos até Pokhara, vila base de onde iniciaremos a tão esperada Annapurnas Trek. Dizem que esta é a melhor caminhada do Nepal quando falamos em paisagem e cultura. E pelo que vimos das fotos do pessoal que acabou de voltar de lá, vai ser mesmo de arrasar. Percorreremos 210km em cerca de 18 dias e chegaremos a uma altitude de 5.416m. Portanto pessoal, não se preocupem se não mandarmos noticias dentro de uns vinte dias, pois ficaremos durante esse tempo sem comunicação. Mas acreditamos que esse tempo de espera valera a pena, pois as próximas fotos e relatos prometem ser show de bola.

Nos vemos no Himalaia!!

Álbum: Nepal 1

[flickr]set:72157627180955592[/flickr]

Compartilhe

Veja Também

Diário de Bordo

Diário de Bordo 1 – Planejamento 1

21 | dez | 2006
Diário de Bordo

Diário de Bordo 2 – Planejamento 2

21 | fev | 2007
Diário de Bordo

Diário de Bordo 3 – Festa de Despedida

28 | fev | 2007