ícone lista de índices Índice

Diário de Bordo 57 – Mauritânia

Diário de Bordo

(23/05/2009 a 01/06/2009)

Entramos num país onde metade de sua extensão, que é de mais de um milhão de quilômetros quadrados, está coberta pelas areias do Deserto do Saara.

A Mauritânia, oficialmente chamada de República Islâmica da Mauritânia, localiza-se ao noroeste da África e faz fronteira com Senegal, Mali, Argélia e Marrocos. Por estar situado no circuito entre Paris (França) – Dakar (Senegal) e dentro do Deserto Saara, o país sediou diversas vezes parte do espetáculo do rali mais perigoso do mundo, o Rally Paris-Dakar. Após 29 anos de sucesso, em 2008, a corrida foi cancelada devido à ameaças terroristas terem sido anunciadas neste país… forçando os organizadores a transferir o Dakar para a América do Sul, o qual teve seu primeiro episódio em 2009.

A baixa densidade populacional, uma das mais baixas do mundo, foi percebida assim que cruzamos a borda vindos de Mali, pois ali já dirigíamos no Saara e a areia tomou conta do cenário, tanto nas dunas como no ar, devido as grandes tempestades de areia. Quando vez ou outra cruzávamos com as vilas, debaixo de um calor de 47 graus centígrados ou mais, ficávamos boquiabertos em ver como o ser humano consegue viver em condições tão extremas de seca e calor. E como se isso não fosse suficiente, a areia fina que deve entrar em todos os cantos da casa, torna a ação de qualquer paninho inútil. Em nosso caso, quando acampávamos a noite, sonhávamos com aquela história de que o deserto é quente durante o dia e frio durante a noite, o que, na verdade, não passou de ilusão, principalmente porque estamos em pleno verão!!!

Nouakchott, capital do país, é uma cidade litorânea e a brisa que vem do mar ajuda a baixar a temperatura. Nos dias que ficamos lá para refrescar, aproveitamos para nos deliciar com frutos do mar provenientes desta costa que é muito rica em pesca. Mas o mercado do peixe desta cidade é que é coisa fora de sério, onde milhares de pessoas dentre pescadores, vendedores, carregadores e inclusive ladrões de peixe, fazem de sua vida diária um legítimo espetáculo. E isso funciona mais ou menos assim: em meio a colorida multidão, os barcos vindos do alto mar descarregam seus peixes através de carregadores, que por sua vez, carregam o peixe em caixas sobre suas cabeças. Estes, quando não filam uns peixinhos de sua própria caixa, colocando-os nos bolsos de suas jaquetas, são saqueados pelos ladrões de peixes, que estão ali, na cara dura, somente com esse propósito. A retirada dos barcos da água também é legal, quando o barco é rodeado por homens que seguem um canto dando um ritmo ao trabalho, pra não desperdiçar força na hora errada. Enfim, ver o tumulto nas bancadas onde o peixe é vendido e ver os milhares de pequenos peixes partindo em carros literalmente caindo aos pedaços é algo que não dá para deixar de registrar. Nouakchott é isso, é o mercado do peixe.

Da costa, adentramos novamente ao deserto, agora com o propósito de visitar alguns dos oásis que faziam parte das importantes rotas do comércio trans-saara. Estas vilas estavam situadas estrategicamente entre o Mar Mediterrâneo e a África Sub-Saariana e muitas delas tornaram-se famosas não só pela sua história, mas também devido a sua arquitetura e ao seu cenário exótico. Chinguetti, uma das mais famosas por estar situada na borda com imensas dunas do deserto, está ameaçada pela invasão da areia.

Para nós que gostamos de nos isolar na natureza em nossos acampamentos, a Mauritânia foi um dos melhores países da costa oeste africana. Em qualquer canto desse deserto sem fim é possível de achar um lugar de um visual intenso para parar o carro, preparar um chá africano e após a janta, contemplar as estrelas do lugar mais especial, o teto do Lobo.

Mas nossos dias por esse país passaram rápido, pois devido estarmos em época de eleições, ganhamos somente 10 dias de visto. Quando chegou o sétimo dia, tínhamos uma decisão importante a fazer: para ir ao Marrocos, poderíamos voltar de Atar até Nouakchott e dirigir ao norte costeando o Atlântico até as proximidades de Nouadhibou ou, opção bem mais interessante, cruzar em puro deserto, sem estradas, guiados apenas pelo GPS e por um trilho de trem, rumando também sentido Nouadhibou. Bom, se cruzássemos o deserto, dirigiríamos apenas uns 520km sem estradas, quando por Nouakchott seriam uns 1.000km por estradas asfaltadas.

A vontade de encarar o deserto era grande, mas os recentes problemas mecânicos somado a alguns probleminhas atuais do Lobo, poderiam resultar em um problemão, caso nosso carro pifasse em meio ao nada. Descobrimos então de um holandês que mora em Atar há 7 anos e que além de boas informações, possui uma mecânica, onde poderíamos fazer um breve chek-up no carro. Dito e feito, oitavo dia foi de oficina e os próximos, nono e décimo, seriam tempo suficiente para alcançar a borda pelo deserto.

Com o carro quase zero bala novamente, partimos de Atar e rumamos ao norte, por péssimas estradas, onde encontraríamos o trilho de trem e acabariam as estradas. Após Choum, assim que caímos no deserto, bateu aquela famosa sensação do quão pequeno somos diante dessa natureza, que se não for tratada com respeito, pode simplesmente nos engolir, num piscar de olhos.

Nos primeiros quilômetros, a primeira encalhada, ainda usando calibragem alta para a areia. Foi hora de cavar, esvaziar os pneus, catar uns capins secos e lá fomos nós, após outra meia horinha de viagem, para a segunda encalhada, exatamente quando tentávamos cruzar em dunas. Mais um pouco de trabalho e os pneus perderam ainda mais pressão, indo agora para 1 bar nos dianteiros e 1,2 bar nos traseiros.

Quanto ao terreno, vezes ficava duro e liso e era quando progredíamos em nosso odômetro, mas quando as dunas apareciam, parecia que não acabavam mais e a media horária caía totalmente. Nosso objetivo era de ultrapassar a metade daqueles 520km, pois próximo dia, além de muito deserto, ainda teríamos que lidar com a burocracia de fronteira para não termos problema com o visto. Em certa parte do trajeto, seguindo a informação do GPS, rumamos ao sul, deixando em mais de 10km o trilho de trem para trás. E se arrependimento matasse… caímos em uma região de camel grass, que é o terror para os pilotos de um Paris-Dakar, principalmente motos, pois são pequenos montes de areia (entre 50cm e 100cm) que se formam ao redor de capins e que estão a menos de metro um do outro. Isso dava vontade de chorar, principalmente porque não acabavam mais…

A noite chegou e para isso, já estávamos estacionados propositalmente ao lado do trilho do trem, pois queríamos muito vê-lo passar, já que esse trem possui a fama de ser um dos mais longos do mundo, podendo alcançar 2,5km de comprimento. O trem passou três vezes em nossa frente e desta vez, pelo que contamos, estava com cerca de 130 vagões.

Último dia de permissão para ficarmos no país, o terreno melhorou em certas partes, mas também cruzamos muitas dunas, camel grass e outros tipos de terreno e foi logo após o meio-dia que botamos o pé no asfalto novamente e dali, poucos quilômetros ao norte, já estávamos deixando a Mauritânia para entrar no Marrocos, um de nossos grandes objetivos aqui do Oeste da África. Nos vemos lá!!!

Álbum: Mauritânia

[flickr]set:72157631545775472[/flickr]

Compartilhe

Veja Também

Diário de Bordo

Diário de Bordo 1 – Planejamento 1

21 | dez | 2006
Diário de Bordo

Diário de Bordo 2 – Planejamento 2

21 | fev | 2007
Diário de Bordo

Diário de Bordo 3 – Festa de Despedida

28 | fev | 2007