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Diário de Bordo 34 – Índia 3

Diário de Bordo

(06/04/2008 a 22/04/2008)

De volta a Índia…

Depois de um mês de sossego e tranqüilidade no Nepal, cruzamos a fronteira de volta a Índia. Nosso primeiro destino era a capital do país, Delhi, onde pretendíamos solicitar nosso visto do Irã. Como já tínhamos um pouco de experiência neste país, esperávamos que Delhi fosse como qualquer outra cidade indiana: suja, poluída, tumultuada, congestionada, ou seja, uma Varanasi 12 vezes maior. Porém, confessamos que a capital nos surpreendeu muito com sua limpeza e organização de cidade grande e desenvolvida.

Paramos nosso carro em um dos estacionamentos do Nehru Park, lugar onde as pessoas que viajam de carro como nós, montam seus acampamentos e chegam a ficar semanas e tudo para esperar vistos como dos países Paquistão e do Irã.  É incrível como as notícias se espalham de boca em boca e todos estes viajantes de carro vêm parar no mesmo lugar por indicação de outros viajantes.

Após termos nosso visto iraniano solicitado, demos uma passada pelas ruas estreitas e lotadas da Velha Delhi e vislumbramos, apenas de fora, a oponência do Forte Vermelho, construído no século XVII para ser uma residência real. Foi neste forte, em 15 de agosto de 1947, que o Primeiro Ministro da Índia estendeu a bandeira indiana marcando o final do domínio britânico.

Depois de quatro dias de parada, pegamos a estrada rumo a Agra, cujo nome é praticamente um sinônimo a Taj Mahal, a arquitetura mais famosa da Índia. Nossa visita a este espetacular monumento seria perfeita, se voltar a comer a comida da Índia não significasse voltar às dores de barriga…

Taj Mahal, o mais extravagante monumento feito em nome do amor, foi construído pelo imperador Shah Jahan em memória de sua esposa favorita chamada por ele Mumtaz Mahal ( “A jóia do palácio”), a qual morreu em 1631 após dar à luz ao 14º filho. A morte de Mumtaz deixou o imperador tão de coração partido, que dizem que seu cabelo ficou branco da noite para o dia. A construção do Taj Mahal começou no mesmo ano da morte da esposa e terminou 22 anos depois. Cerca de 20 mil homens trabalharam na obra, os quais foram trazidos de várias cidades do Oriente para trabalhar no suntuoso monumento de mármore branco e milhares de pedras semi-preciosas.

Pouco antes do término da obra, em 1657, Shah Jahan adoeceu gravemente e seus filhos o tiraram do poder e permitiram-lhe viver exilado no forte de Agra. A história conta que o ex-rei passou o resto dos seus dias observando pela janela o Taj Mahal e, depois da sua morte em 1666, foi sepultado no mausoléu lado a lado com a esposa, gerando a única ruptura da perfeita simetria do conjunto.

Em finais do século XIX vários setores do Taj Mahal estavam muito deteriorados por falta de manutenção e saqueamentos, porém em 1908 completou-se a sua restauração ordenada pelo vice-rei britânico. Em 1942 e de 1965 a 1971, o governo construiu um andaime gigantesco cobrindo a cúpula, prevendo os ataques aéreos provenientes de guerras que o país estava envolvido. Já as ameaças mais recentes provêm da poluição ambiental que dizem ter alterado a cor original do mármore branco.

Existem uma infinidade de lendas sobre o Taj Mahal, tais como: a história de que o imperador teve à sua disposição os melhores arquitetos e decoradores, que depois de completarem os seus trabalhos, foram cegados ou mutilados para que não pudessem voltar a construir um monumento que igualasse tal superioridade; outros supõem que o imperador pretendia fazer para ele próprio uma réplica do Taj Mahal original na outra margem do rio, em mármore preto, mas acabou deposto por seu filho antes do início das obras; outra história narra que Lord William Bentink (governador da Índia na década de 1830) pensou em demolir o Taj Mahal para vender o mármore; e assim como estas, surgiram diversas outras lendas, porém nenhuma referência respeitável permite assegurar estas hipóteses, nas quais alguns crêem e outros discordam.

Bom, mas visitar o Taj Mahal foi incrível mesmo. Essa construção possui uma magia tão grande que não dá mais vontade de parar de olhar para ela. Não é por pouco que é classificada pela UNESCO como Patrimônio da Humanidade e que foi recentemente anunciada como uma das Sete Maravilhas do Mundo Moderno.

Malmente estávamos melhores dos desarranjos causados pela falta de higiene no país e caímos na estrada novamente, agora, sentido ao estado do Rajastão, Terra dos Reis e Marajás. O Rajastão foi o lugar onde viveram diversas clãs de guerreiros (Rajputs), que controlaram esse território da Índia por mais de 1.000 anos. Apesar de os Rajputs forjarem temporárias alianças e casamentos de conveniência entre seus reinos, o orgulho e a independência sempre falaram mais alto e eles acabavam lutando entre si. Foi durante essas lutas que os guerreiros enfraqueceram-se e caíram sobre o domínio do Império Mughal. Somente muitos anos mais tarde é que os Rajputs foram aos poucos recuperado sua força, mas não demorou muito e os britânicos chegaram. A maioria dos reinados aliaram-se aos britânicos e conseguiram o direito de manterem-se independentes, com a condição de sujeitarem-se a certos controles políticos e econômicos, o que resultou no início do declínio dos marajás. Como testemunho desta época, podemos encontrar ainda hoje uma coleção de magníficos fortes e palácios que pertenceram aos Rajputs e outras clãs que dominaram por séculos as montanhas e o deserto do Rajastão.

Um dos maiores entretenimentos dos marajás naquela época era a caça de animais incluindo tigres, leopardos, porcos selvagens, ursos e aves, portanto existiam diversas fazendas de caça nos arredores das cidades e palácios. Um desses lugares, hoje, tornou-se um santuário de vida animal, o qual é aberto ao público através de safáris. Estamos falando do Parque Nacional Ranthambore, onde fomos em busca de mais uma chance de ver os tigres selvagens.

No caminho para este parque passamos por uma pequena estrada, a qual cruza o interiorzão do estado, onde os campesinos plantam campos intermináveis de trigo. Eles estão na época da colheita e pudemos ver cenas dos trabalhadores no campo, dignas ao Oscar de melhor cenário. No meio de uma das vilas, conhecemos o Sunil, indiano local que nos convidou para visitarmos a sua casa. Tendo que seguir viagem, acabamos parando com o trato de ficarmos apenas alguns minutos. Porém, a visita acabou se prolongando e além de conhecermos a sua casa e toda a sua família, pudemos saborear uma comida caseira e, enquanto nos despedindo de todos, já estávamos com o convite de casamento de sua irmã em nossas mãos. O casamento seria no dia 18 de abril e ficamos super empolgados pelo convite, pois poderíamos presenciar de perto a cultura e a vida de uma família indiana. Mas dia 18 ainda estava longe, então, resolvemos tocar em frente e ver no caminho se poderíamos mudar nossos planos e voltar para o casamento. Nossos pensamentos diziam: “Volta! Volta!” No entanto,  quando nos demos conta de que estávamos na Índia e que teríamos que voltar por estradas horríveis que pegamos no caminho, nem precisamos tomar uma decisão. Ela se tomou por si só… voltar por essas estradas,  NEM PENSAR!!

Aproximando-se do Parque Nacional Ranhambore a paisagem que era seca e desértica mudou rapidamente. O santuário está localizado em um vale entre as montanhas rochosas e é de uma beleza indescritível. Verde e repleto de animais… pavões, periquitos, crocodilos, macacos, antílopes, veados, porcos selvagens, leopardos e a atração principal, os tigres enchem de vida este lugar. São cerca de 40 tigres que habitam o Ranthambore e ver algum deles é como ganhar na loteria, uma questão de sorte. E não é que fomos sortudos… não fomos premiados só com um tigre e sim, com três!

Mais uma vez nossa experiência seria perfeita se não fossem o nosso guia e o motorista indianos. Primeiro que o guia, que nem sabemos se podemos chamá-lo assim, estava se divertindo mais do que nós e guiando-nos era a última coisa que ele estava fazendo. Já o motorista, não sabemos se era de medo ou doque, adorava estragar com as nossas melhores oportunidades de fotos. Quando os animais aparecia no limpo, ele tinha que arrancar o caminhão bem rápido e justo na hora que estávamos prestes a tirar as melhores fotos. Apesar da falta de profissionalismo da turma, foi uma experiência única, ainda mais quando pudemos ver ao vivo e a cores um tigre se preparando para atacar um grupo de veados. Não sabemos se foi bom ou não, mas um dos veados percebeu a presença do felino e num grito alertou todo o bando que saiu correndo para um lugar seguro. Foi um espetáculo da natureza!

Continuando nossa trajetória, dirigimos em busca das pérolas do Rajastão, as cidades que antes foram os reinos dos Rajputs. Udaipur, Jodhpur, Pushkar e Jaipur foram os nossos destinos.

Udaipur é conhecida como a “Cidade dos Lagos”, ou ainda como a “Veneza do Oriente”. Situada longe do deserto, localiza-se entre as Montanhas Aravalli e entre três lagos. O ponto de maior interesse na cidade é o conjunto de palácios cor creme, os quais formam o City Palace, maior e mais antigo palácio do Rajastão. Fizemos uma visita a este palácio e foi muito interessante ver um pouco da história indiana e presenciar como era a vida de um marajá. Mais bonito do que visitá-lo internamente, é a vista que temos de todo o complexo a partir do outro lado do Lago Pichola.

No caminho para Jodhpur, passamos pela cidade de Ranakpur, onde visitamos um dos templos hindus mais bonitos da Índia. O nome do templo é Chaumukha Mandir (Templo de Quatro Faces), que foi construído em 1439 e dedicado ao Deus Adinath. O templo é composto por uma série de 29 paredes suportadas por nada mais, nada menos que 1.444 pilares. Seu interior é completamente trabalhado em mármore branco leitoso e os detalhes são incríveis. Enquanto o calor pegava lá fora, ficamos dentro do arejado templo tentando perceber todos os detalhes.

Já a cidade de Jodhpur, no início do Deserto de Thar, foi o ponto alto de nossa visita ao Rajastão. Esta cidade também é chamada de a “Cidade Azul” devido a grande quantidade de casas azuis espalhadas principalmente pela cidade antiga.  Tradicionalmente, o azul significava a casa de um Brahmin (uma das castas indiana), porém atualmente a cor azul foi aderida por todos na cidade e dizem que ela ajuda a refrescar as construções e também a repelir os insetos.

No centro de Jodhpur, sobre uma montanha rochosa de 125m de altitude está localizado o massivo Forte Mehrangarh. Fizemos uma visita com áudio-tour e tivemos uma magnífica mistura de história, com informações e anedotas que fizeram a visita muito interessante e gostosa. Deixamos os palácios e o forte boquiabertos, tamanha a sua beleza.

Protegida por uma alta muralha de pedra com sete entradas, atualmente, Jodhpur tornou-se a segunda maior cidade do estado, porém, por ainda manter suas características medievais, continua sendo uma grande atração.

Depois de a “Cidade Azul”, chegamos na “Cidade Santa” de Pushkar. Esta pequena, mágica e árida cidade, conta com 400 templos em volta de um lago que, segundo a mitologia hinduísta, foi criado pelo Deus Brahma (um dos deuses da trindade hinduísta) quando o mesmo derrubou uma flor de lótus no local. Por causa disso, os hindus acreditam que o Lago de Pushkar é sagrado. Ao seu redor foram construídos 52 ghats (escadarias que dão acesso ao lago) e acredita-se que a água da cada ghat possui poderes especiais. Algumas das escadarias também possuem particular importância, como o Gandhi Ghat, onde as cinzas de Gandhi foram derramadas.

Pela terceira vez, e como sempre, os indianos conseguiram estragar com a boa impressão do local e fizeram a magia desaparecer em um segundo, quando, ao redor do lado de Pushkar, tentaram nos enganar. Chegam para todos dizendo que são padres hinduístas e nos abordam querendo nos abençoar e fazer oferendas em nosso nome às margens do lago. Óbvio que no final eles pedem uma recompensa, pois para eles, somos um caixa eletrônico e sempre que nos vêm, seus olhos fazem trim trim ($$). Almoçamos, demos uma volta pelo lago e decidimos seguir adiante sentido Jaipur, em busca de melhores experiências.

Jaipur é a cidade capital do estado e, como toda cidade do Rajastão, possui um segundo nome… a Cidade Pink, por causa da cor das pedras usadas exclusivamente na cidade muralhada. A cidade antiga de Jaipur é muito bonita com sua cor rosada (que tá mais para um laranja do que rosa) e é muito interessante como os mercados se situam no meio das construções antigas. Mas em vez de nossas experiências melhorarem, elas só foram de mal a pior. O assédio sobre nós foi enorme, mas sofrem mesmo as mulheres, que são olhadas descaradamente de cima até embaixo. Teve até uma hora que caímos na deles e começamos a nos divertir com a situação e fazer o mesmo com eles, que ficavam totalmente incomodados. No entanto, com o passar do tempo, o negócio acabou nos irritando, irritando… até que não deu mais a mínima vontade de continuar por lá. Um dia foi suficiente e já chegamos em Delhi, de onde partiremos para o norte, sentido as montanhas indianas.

Infelizmente o turismo chegou forte às pérolas do Rajastão, o que tirou um pouco do seu charme e magia. O local é repleto de cultura, cores e história, mas temos que admitir que tudo aqui virou “coisa pra turista”. Somos sortudos de ter o Lobo da Estrada conosco, o qual nos leva a lugares de difícil acesso para muitas pessoas. E foram nesses pequenos lugares e vilas que pudemos ver a tradição sem interesse, com mulheres vestidas tipicamente e os homens formando um mar de turbantes coloridos.

Álbum: Índia 3

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