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Diário de Bordo 31 – Índia 2

Diário de Bordo

(14/02/2008 a 04/03/2008)

Incredible India!

Esse slogan, que em português significa Incrível Índia, é utilizado aqui no país em todas as comunicações voltadas para a cultura e o turismo. E estas poucas palavras, interpretadas com muita imaginação, mas muita mesmo… nos descrevem o que é a Índia.

Sair da Praia Agonda foi uma tarefa árdua e por incrível que pareça, ficamos apenas dois dias a mais do que o previamente planejado. Alguns dos carros que vêm para cá, sério mesmo, chegam a ficar até mais de mês além do previsto. Mas este adiamento da partida fica muito fácil de entender quando se pega os primeiros quilômetros de estrada novamente e se explora a Incrível Índia mais de perto.

… e o tumulto recomeça. Apesar de termos sido avisados de sempre dirigir nas principais rodovias do país, já que dirigir nas menores é sem chance, não teve jeito, pois para onde queríamos ir, grandes rodovias não existiam. Partíamos sempre pela manhã, fazíamos uma paradinha rápida para um pão com tomate no almoço e chão novamente. E essas paradas na beira da estrada para um almoço rápido é que são as mais divertidas. Escolhemos os lugares mais inóspitos possíveis para termos um pouco mais de sossego, porém não leva 12 segundos até o primeiro cidadão parar sua bicicleta a menos de meio metro do carro e ficar olhando. O segundo, não menos curioso, para, pois quer ver porque o primeiro parou e passa a ficar olhando também. E logo vem o terceiro, quarto, quinto e assim vai, até aquilo parecer um acidente de trânsito, de tanta gente ao redor do carro. E eles rodeiam, tentam abrir as portas, colam suas caras na janela para ver por dentro, escalam o motorhome e tudo mais. O legal é se estes curiosos são crianças, pois são mais fáceis de assustar quando os mesmos metem o dedão onde não devem.

Mas de volta ao trânsito. Dirigindo por entre os homens, animais e máquinas, descobrimos uma coisa muito interessante. Os indianos recolhem seus espelhos retrovisores para que seu carro fique um pouco mais estreito, ficando, segundo sua esperteza, mais difícil de acontecer acidentes. Haha, e as motos fazem o mesmo, só que elas os colocam para o meio do guidão prejudicando até a visualização do painel. Sem dúvida, eles não devem os tirar de uma vez por serem equipamento obrigatório de segurança. E mesmo sem retrovisores, ninguém olha para os lados antes de entrar na pista e muito menos se preocupam quando param o carro, o que é normal acontecer no meio da rua, mas no meio da rua mesmo. Ah, as vezes não só param, como estacionam também.

Um causo legal nos aconteceu um dia de manhã, quando uma moto com dois caras passou a nos rodear. Eles nos ultrapassavam e em seguida deixavam ser ultrapassados, ultrapassavam e deixavam ser ultrapassados e isso foi por algumas vezes, até que o piloto criou coragem, veio ao nosso lado e falou: Tee, tee e apontava para frente. Estavam nos convidando para tomar um chá em uma vila que se aproximava. Aceitamos… e precisava ver! Primeiro que eles não falavam quase nada em inglês, então ficamos lá, sem conversar, rodeados por pelo mínimo 20 pessoas que sem mais nem menos, paravam e nos olhavam com aqueles olhares hipnotizados! O bar era muito simples e a cidadezinha pequena, mas a quantidade de gente, putz (como diz o Walter), impressionante. A gente até tenta registrar estes momentos com fotos, mas é difícil. Nossa situação ali era feliz pelo convite, mas ao mesmo tempo não víamos a hora de acabar aquele chá e darmos no pé!

E sabem, essa situação dos indianos ficarem rodeando os carros, com uns amigos nossos da Alemanha que viajam em uma Land similar a nossa, a história foi um pouco diferente. Como eles tinham uma carreta sendo rebocada, na terceira vez que o infeliz indiano os deixou ultrapassar, ele esqueceu da tal da carretinha e simplesmente voltou para a pista no momento em que a Land o passou… Só sobrou pena e bico, contavam os alemães dando risada.

Nossa jornada, desde que saímos da Praia Agonda até que chegamos em um local de interesse onde passaríamos alguns dias, levou exatamente 5 exaustivos dias. No meio desse trajeto, somente quebramos a rotina da estrada quando visitamos as  ruínas do Forte Mandu, um dos melhores exemplos da arquitetura Afegã na Índia.

Falando um pouco mais do local de interesse que citamos há pouco, valeu muito a pena visitá-lo. Tá certo que são novamente ruínas, mas são ruínas diferentes, e como… Estamos falando de Khajuraho onde, por volta do ano 1000 d.C. (época da dinastia dos reis Chandela), um surto de criatividade dominou o local, resultando na construção de 85 templos, dos quais 22 ainda existem e em ótimo nível de conservação. Esses templos, para total indignação na época e ainda nos dias atuais, são repletos de frisos e esculturas que mostram os personagens, com um alto nível de detalhe, em diversas posições insinuantes e em todas as possíveis posições eróticas do Kama Sutra.

Como em qualquer patrimônio histórico deste porte, é claro que os templos estavam repletos de visitantes, mas estes com uma grande diferença. Em cada esquina, uma gargalhada em um idioma diferente. Hora era em japonês, hora alemão, espanhol, francês e em toda hora em português, hehe! Mas também, não é pra menos. Certas imagens eram tão fortes que antes de tirar uma foto, olhávamos para os lados pra ver se ninguém estava nos espiando!!! Conhecer este lugar foi uma ótima forma de comemoramos o primeiro ano de nossa expedição.

Quase três dias por Khajuraho e partimos rumo a cidade mais santa da Índia, Varanasi, mas no caminho ainda tivemos a oportunidade de rodar alguns quilômetros dentro de uma reserva de tigres asiáticos, que vivem em companhia de outros animais como: leopardos, antílopes, cervos, crocodilos, macacos e diversas aves, todos em total vida selvagem. Estes parques sequer possuem alguma cerca que os delimite ou cerquem os animais.

Não vimos nem os tigres e nem os leopardos, mas mesmo assim valeu a pena pois as pegadas deles estavam lá e eram de menos de 24 horas. Além disso, avistamos todos os outros animais que citamos acima e em um cenário muito bonito. Em lugar onde existem tigres e leopardos, não é imprescindível que os vejamos. Para sentir aquela sensação de adrenalina, basta saber que a cada curva podemos topar com um deles.

Quando finalmente chegamos na dita cuja cidade santa de Varanasi, malmente a víamos. O sol estava prestes a se por e em meio a tamanha poluição, acho que nossa visibilidade era menor que a do Rio da Prata, em Bonito, porém a do Rio da Prata, debaixo d’água. O tumulto, trânsito, buzinas, luz alta e tudo o que se possa imaginar no meio da rua, nos deram as boas vindas. Sorte que tínhamos as coordenadas de GPS de um hotel onde poderíamos pagar uma mixaria para usar somente o estacionamento, banheiros e chuveiros.

Varanasi, que se situa as margens do Rio Ganges, é também conhecida como Cidade de Shiva, um dos deuses Hindus. Peregrinos do país todo se deslocam para este lugar para se banhar no Rio Ganges e purificar suas almas. São cerca de 60.000 pessoas todos os dias que se banham, nadam e tomam desta água, que de tão poluída, nem mais oxigênio possui. As estatísticas são ainda piores quando amostras deste rio mostram que a água possui 1,5 milhões de bactérias fecais por cada 100ml. Sendo que em águas seguras para o banho, estes números não poderiam passar de 500 para a mesma amostra.

Mas a vida, as cores e as pessoas transformam e fascinam esta cidade, que pode ser considerada uma das cidades em vida mais antigas do mundo. Mark Twain escreveu que Bernares, como Varanasi era chamada anteriormente, é mais velha que história, mais velha que tradição, mais velha que lenda e se parece duas vezes mais velha que todas elas juntas. Todos os dias, tanto no amanhecer como no entardecer, cerimônias são celebradas e milhares de pessoas, trajadas tipicamente, embelezam as margens do Ganges.

Varanasi tem sido um desejado lugar para se morrer, pois a morte aqui oferece Moksha – libertação do ciclo de vida e morte. A cidade é o coração do universo hindu, um lugar entre o mundo físico e espiritual… e o Ganges é visto como um rio de salvação e vida eterna. Para impressionar ainda mais nossas cabeças, pessoas de todos os cantos vêm para cá esperar sua morte e com isso, lotam alojamentos que se situam em frente as escadarias de cremação, onde diariamente pessoas são cremadas em público. Impressionante!!!

Após este banho de tradição e cultura, nos despedimos da Índia por algumas semanas, quando percorreremos pela grandiosa cordilheira do Himalaia, no Nepal.

Namaste!!!

Álbum: Índia 2

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