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Diário de Bordo 35 – China 1

(25/04/2016 a 07/05/2016)

 

Made in China

Se vê tanto nesse mundo a frase Made in China, que a nossa vontade de conhecer essa tal de China era grande. Sabíamos pouco sobre ela, se comparado ao que vimos e aprendemos nos 30 dias viajando por lá. E algo podemos adiantar logo no início – esses chineses não são fracos. Aparentam pequenos, tímidos, inofensivos, mas quando se põem para trabalhar, pode esperar que lá vem coisa grande. Nossa percepção foi que se existe um país que está se preparando fortemente para o futuro é a China. Mas em certo ponto até demais. Os chineses investiram tanto em sua capacidade produtiva, que uma crise pode os deixar ociosos e isso custa muito dinheiro. A China hoje é o maior exportador e o terceiro maior importador de mercadorias. Baseado no poder de compra, é a segunda maior economia do mundo.

Mas vamos lá. Deixem-nos tentar colocar nossas impressões sobre esse incrível país neste diário de bordo.

Deixamos nosso carro em Ulaanbaatar, capital da Mongólia, e fomos para a China de trem. O motivo é o custo alto das taxas e licenças caso fossemos com nosso carro (estrangeiro), além de que um guia teria que viajar cem por cento do tempo conosco e o custo, novamente, a nosso cargo. Por esses dois motivos – viajar mais barato e termos mais liberdade – resolvemos ir somente com uma pequena bagagem nas costas.

A primeira estação de trem na China foi Erenhot (fronteira com Mongólia) e ao desembarcar, nossa, que diferença com o país vizinho Mongólia. Em cada vagão havia um oficial recepcionando os passageiros. Trajes impecáveis, mas nenhum piscar de olhos ou sorriso. Seguimos para a imigração em um prédio grande, bem estruturado e a coisa fluiu com eficiência e em inglês fluente. As boas vindas foram dadas.

Mas Erenhot não tinha nada que nos interessava. Ficamos só para o almoço e seguimos de trem para Datong. Logo quebramos um paradigma! Ouvimos dizer que os chineses eram mais fechados e um pouco antipáticos, mas que nada, foram todos muito amigáveis. E também muito respeitosos, apesar que certos costumes (falaremos sobre isso mais adiante), em nosso país, talvez não fossem considerados tão respeitosos. É uma questão cultural. O respeito os chineses herdaram do filósofo chinês Confúciu, que seus pensamentos, na verdade, foram oficialmente sancionados no país. Ele pregava a moralidade, o “ser correto” nas relações interpessoais, a justiça e a sinceridade e dava muito valor a família, principalmente no respeito pelos mais velhos. Um legado de Confúciu: “Não faça aos outros o que você não quer que seja feito a você.”

Os ensinamentos de Confúciu mostram que a China já era muito avançada há 2.500 anos atrás. Outro exemplo dessa época é Sun Tzu, cujas lições persistem até hoje no livro mundialmente comercializado “A Arte da Guerra”. E tem mais essa: historiadores que desvendaram os Soldados de Terracota descobriram que os chineses, há 2.200 anos atrás, já utilizavam técnicas de cromagem para preservarem seus armamentos. Por incrível que pareça, quando espadas e facas foram desenterradas, ainda estavam com fio. E nós, até um certo tempo atrás, dávamos os méritos aos alemães e americanos pela descoberta, que acontecera respectivamente nos anos 1937 e 1950. Isso não é surpreendente? Há quem fala que o chinês copia tudo, mas temos que dar o braço a torcer, pois foram eles os inventores do papel, impressão, bússola e a pólvora (quatro grandes invenções) que contribuíram para o desenvolvimento de toda Ásia e Europa na época. Então, assim fomos nós seguindo por este país, levando um banho de sabedoria das coisas que foram “Made in China”.

 

Algumas informações úteis sobre a China:

Capital: Pequim ou Beijing

Língua oficial: mandarim

Governo: República popular socialista unipartidária (só existe um partido)

Presidente: Xi Jinping

Terceiro maior país do mundo (9,6 milhões de quilômetros quadrados)

Maior população do mundo (1,36 bilhões de habitantes)

Segundo maior PIB

Maior exército em número de soldados e segundo maior orçamento de defesa

IDH considerado elevado

Moeda: Yuan

 

A história da China é muito longa, uma das civilizações mais antigas do mundo, o que deixou o país repleto de riquezas históricas. A começar pelas cidades, que possuem muralhas que as protegiam na época das dinastias. Datong é uma delas e essa cidade, diga-se de passagem, está investindo muito na restauração de toda muralha e centro histórico. Mas a China como um todo está fazendo isso. Vimos muitas obras sendo feitas em lugares que até pareciam não serem tão necessárias. E lá estavam os tratores, retroescavadeiras e outros maquinários. Como dissemos anteriormente, quando eles fazem, fazem de verdade. Parece que não há barreiras que viadutos ou pontes não possam superar. O contra desse crescimento desenfreado é o alto impacto nos recursos naturais. Este país sofreu grave deterioração ambiental e poluição nas últimas décadas. Outro problema do grande desenvolvimento econômico no país é que o retorno é mal distribuído e por isso há um grande desequilíbrio social. No quesito ambiental há um pró – a China é líder mundial em tecnologias de energias renováveis, como turbinas eólicas e painéis solares, além de que nas ruas, este foi o país que mais víamos automóveis e motocicletas movidos a bateria.

Datong foi legal por mais motivos. Primeiro, a comida. Experimentamos pratos muito gostosos e baratos. Existem restaurantes caros, claro, mas há também comida boa a custo baixo. Em Datong percebemos o quanto os chineses comem. São uns animais quando se põe a mesa. E eles possuem um costume de pedir uma grande diversidade de pratos. Nós, por exemplo, pedíamos um arroz e mais um ou dois acompanhamentos e eles, se também estivessem em duas pessoas, pediriam cinco pratos ou mais. E comem, comem bem. Para beber, água quente. No começo estranhamos e pensávamos que eles haviam trazido a térmica e esquecido o chá, mas não, tomam água quente mesmo, as vezes com um pouco de limão exprimido. Os cardápios são extensos. Um amigo chinês nos falou que na China é possível comer um prato diferente todos os dias e nunca repetir, tamanha diversidade culinária.

O motivo principal que nos trouxe a Datong foram as cavernas Yungang, com suas 51.000 estátuas escavadas na própria rocha, dos séculos 5 e 6. Há outros exemplos dessa arquitetura de rocha no mundo, como Petra, na Jordânia, Lalibela, na Etiópia e Capadócia, na Turquia, mas esta difere-se por, além das 252 cavernas terem sido escavadas pelo homem, todas possuem estátuas de Buda, desde pequenas até com 17 metros de altura. Pena que as esculturas mais detalhadas não pudemos fotografar. Imaginamos ser proibido, pois justo essas são pintadas e os flashs das câmeras podem deteriora-las.

Visitamos as cavernas em um dia chuvoso e mesmo assim dividimos espaço com muitos turistas chineses. O boom na economia fez a renda per capita chinesa crescer 8% ao ano nos últimos 30 anos, então eles estão viajando muito. Isso tem feito valer a pena os altos investimentos em turismo no país. Quando vinha um grupo grande, nós ficávamos reparando no seu guia, que carregava uma bandeira alta para ser melhor distinguido e o grupo todo usava bonés iguais e de mesma cor chamativa para ninguém se perder.

De Datong fomos de trem para Pingyao. Essa é uma das cidades muralhadas mais preservadas na China, com casas antigas, templos, torres e tudo com muitos detalhes chineses e lanternas vermelhas penduradas nas ruas e nas fachadas das construções. A muralha ainda é toda original. É uma cidade que apesar do turismo e desenvolvimento, sua comunidade ainda vive como antigamente, andando de bicicleta nas ruelas da cidade, bem como passando parte de seus dias em frente as suas casas, papeando com os vizinhos. Em Pingyao surgiu o primeiro banco chinês e este desenvolveu o cheque para facilitar as transações do comércio da prata. Mas por nossa ida ter coincidido com um feriado nacional (e dizem que há poucos feriados no país por ano), a cidade estava lotada. Parecia que toda a China resolveu ir para lá naquele feriado. Aí, claro, os preços aumentam, pois tudo fica concorrido. E foi pela dificuldade de acharmos um lugar barato que nos demos de presente um bom hotel em estilo chinês. Uma ótima oportunidade para um merecido descanso.

Fora das muralhas a vida é normal e mais agitada, e nós adorávamos comer nas vendinhas de rua. Experimentamos espetinhos cozidos, onde escolhe-se dentre uma grande variedade de opções o que quer comer, como legumes, carnes, cogumelos, vegetais, coisas estranhas que não sabemos o que são e, após a escolha, estes são mergulhados numa bacia com água fervente para cozinhar. Depois são comidos com molho de amendoim. Humm, delicioso. No final o atendente contava os palitos, multiplicava pelo valor unitário e nos mostrava com sua mão o valor a pagar. Detalhe, com uma só mão eles contam até dez (vejam esse POST que já publicamos anteriormente sobre essa contagem).

De Pingyao fomos de trem para Xi’an. O trem é um bom meio de locomoção na China. Há uma extensa linha férrea que conecta boa parte do país. São eficientes, pontuais, silenciosos e há, de acordo com o preço, diferentes tipos e velocidades. A China possui mais trens bala que qualquer outro país do mundo. Nós optávamos pelos trens mais lentos e mesmo assim ganhávamos tempo, pois podíamos passar a noite viajando em vagões com camas. Cada vagão possui cabines abertas e em cada cabine há seis camas. Bem confortáveis, apesar de que não temos ideia da frequência com que são trocadas as roupas de camas. Em frente a cabine, no corredor, há duas cadeiras escamoteáveis com uma mesinha para refeições. A comida mais comum no trem é o cup noddles (macarrão instantâneo que já vem num copo), que quase todos passageiros trazem consigo. É preciso apenas adicionar água quente e esperar cinco minutos e os vagões oferecem água quente.

Dos trens ficaram muitas lembranças do comportamento dos chineses. Algumas daquelas que comentamos que talvez não fossem tão respeitosas em nosso país. Primeiro que comem de boca aberta. Quanto mais barulho, melhor. Arrotos são frequentes e recomendados, pois demonstram satisfação. E quando se põem a comer os cup noddles, os devoram, colocando os copos próximo a boca e sugando o macarrão como se fosse a última refeição. Os chineses tem o costume de comer sementes de girassol, mas deixam as cascas espalhadas por onde passam, igual passarinhos. Nos desculpem pela franqueza, mas peidos, aparentemente, eram soltados com gosto. Nós que virávamos seus alvos nos trens, ônibus ou albergues. O que não estamos mais acostumados e acontece muito na China é pessoas fumando em locais fechados. Os chineses fumam muito e em todos os lugares. O absurdo é quando fumam ao mesmo tempo que tomam café da manhã, ou melhor, noddles da manhã. Em uma mão estão os chopsticks (palitos de comer) e em outra o cigarro. Nos albergues que ficávamos, onde os banheiros e chuveiros são compartilhados, os vimos fumando e tomando banho ao mesmo tempo. Ficavam só com a cabeça e um braço fora d’água.

Xi’an é uma cidade grande, mas muito interessante e bonita. Possui muralha também e no centro há um quarteirão muçulmano. Jeito muçulmano por trás de olhos puxados. Na verdade são chineses muçulmanos, mas diferentes devido aos costumes e vestimenta. Alguns homens deixavam crescer uma barba ralinha. Havia de tudo e a comida era deliciosa. Ali perdemos a oportunidade de tirar uma foto de uma mulher dormindo sobre os fígados de boi que ela vendia em sua venda. Quando pegamos a câmera alguém a acordou e a foto não rolou.

Xi’an para nós foi imperdível, pois foi de lá que partimos para visitar os Soldados de Terracota e para fazermos a caminhada nos precipícios de Hua Shan, algo que já sonhávamos fazer desde que planejávamos esta viagem. Os links abaixo, que postamos ainda da China, falam sobre esses dois lugares incríveis:

 

Soldados e Cavalos de Terracota.

Caminhada dos precipícios de Hua Shan.

 

De Xi’an, dessa vez, foram 20 horas de trem até Jishou, mas a continuação sobre o sul da China e sua capital Beijing ficará para o próximo diário de bordo, que vem logo aí…

 

Para mais posts sobre esse trajeto, acesse:

 

Itinerário percorrido

Itinerário percorrido China 1

Fotos

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