(27/11/2016 a 04/01/2017)
Entre a Ásia e a Europa.
Assim que entramos na região do Cáucaso para visitar os países Geórgia, Armênia e Azerbaijão, uma dúvida surgiu: “Estávamos na Ásia ou na Europa?”
A resposta é controversa desde a Antiguidade, pois não envolve apenas questões geográficas, mas também culturais e históricas. Politicamente a região do Cáucaso está voltada para a Europa. Suas capitais estão em pleno desenvolvimento e globalização e alguns países desejam até fazer parte da União Europeia. O interior, porem, ainda é rudimentar, pobre e culturalmente semelhante a Ásia. Dizem que os três países do Cáucaso são transcontinentais, mas onde, exatamente, está a divisa? Em nossas pesquisas, a resposta que mais convenceu foi (começando pelo sul e seguindo ao norte): a divisa sobe pelo Mar Egeu no Mediterrâneo, passa pelo Estreito de Bósforo até chegar ao Mar Negro, acompanha as bacias hidrográficas do Grande Cáucaso, sobe pelo norte do Mar Cáspio até a foz do Rio Ural, segue então por este rio até os Montes Urais e dali, ao Oceano Ártico. Geograficamente falando, então, no momento que entramos na Geórgia ainda estávamos na Europa, mas logo nos primeiros quilômetros, quando cruzamos as montanhas do Grande Cáucaso, voltamos para a Ásia.
A região do Cáucaso é minúscula se comparada aos países que cruzamos previamente, mas é um caldeirão que borbulha há milhares de anos. Para contar a sua história é necessário escrever grande parte da história da humanidade. Há indícios de que o Cáucaso foi o berço da civilização e da agricultura. A região era tão almejada que sofreu invasões sucessivas dos assírios, gregos, romanos, bizantinos, árabes, persas, mongóis, turcos otomanos, russos, do Timur do Uzbequistão, de Alexandre – O Grande e tantos outros. Guerras sempre aconteceram e se intensificaram após os três países conseguirem a independência da URSS (a propósito, Josef Stalin, líder da União Soviética de 1922 a 1953, era georgiano nascido na cidade de Gori). Os chamados Conflitos do Cáucaso foram uma série de guerras civis, conflitos separatistas e étnicos e até das nações entre si. Ainda hoje a Armênia e o Azerbaijão disputam uma região chamada Nagorno-Karabakh, enquanto a Geórgia enfrenta o separatismo das regiões Abecásia e Ossétia do Sul, ambas suportadas pela Rússia. Com esse histórico, é real o que um local nos disse, que eles sempre viveram em guerra.
Nosso itinerário foi influenciado pela situação política do Cáucaso. Devido aos conflitos, não existem fronteiras entre o Azerbaijão e a Armênia, tampouco entre a Armênia e a Turquia, que também já estiveram em guerra no passado. O Azerbaijão exige visto para brasileiros e o lugar mais fácil para adquiri-lo era na capital georgiana. Por tudo isso a Geórgia passou a ser nosso país base para a exploração dos outros, fazendo-nos voltar para lá três vezes.
Vindos da Rússia, nós acessamos a Geórgia pelo Desfiladeiro Dariali, que cruza as montanhas do Grande Cáucaso (uma cordilheira de 1.200km de extensão com diversos picos acima dos 5.000m de altitude) e paramos na pequena vila de Stepantsminda. Um lugar lindo, no meio de montanhas e a sua principal atração era o Monastério Trindade Gergeti, situado 500m acima do vale e acessado por uma estrada pequena, íngreme e de curvas muito fechadas. Se fosse verão, seria fácil. Mas era inverno e a estrada estava coberta de gelo e neve, então o conselho dos locais foi para não subirmos com nosso carro, pois estava liso e perigoso. O conselho veio de taxistas, então pensamos que queriam nos enganar e ganhar um dinheirinho com a corrida. Mas não, a subida foi mesmo puxada. Mas o Lobo aguentou firme e apesar de patinar no gelo, deu conta do recado. O grande problema foi a descida. Ali não funcionou o ditado “para descer todo santo ajuda”. Nós começamos pelo meio-dia e o sol já derretia o gelo da estrada, deixando-a ainda mais lisa. Muitas vezes deslizávamos sem controle morro abaixo e o carro só parava quando a roda encontrava um obstáculo ou entrava no rastro deixado por outros carros. Dava um frio na barriga só de olhar para o lado e ver que se deslizássemos para fora do trilho, rolaríamos morro abaixo. Além do gelo, tínhamos que manobrar para fazer as curvas, de tão fechadas. Numa dessas a bomba da direção hidráulica estourou, derramando todo o óleo na estrada. Que sufoco! Mas sobrevivemos! E valeu muito a pena, pois o monastério lá no alto era lindo.
Tanto a Geórgia, quanto a Armênia, possuem centenas de monastérios, os quais, normalmente, estavam inseridos nos lugares mais espetaculares. Se a paisagem fosse linda, provavelmente haveria um monastério. No final de nossa passagem pelo Cáucaso, de tantos monastérios, já estávamos cansados de visita-los, mas parabenizamos aos monges, que tinham o dom de escolher os lugares mais lindos para construí-los. As suas paredes robustas de pedra resistem às centenas, ou até milhares de anos.
Passamos uma semana gelada e molhada na capital da Geórgia a espera do visto para o Azerbaijão. Nossa base foi uma pousada no centro histórico de Tbilisi. Dormimos no carro e usamos a infraestrutura da pousada, onde também reencontramos o amigo Jonny, que esteve recentemente conosco no Afeganistão e também visitava a região. A semana custou a passar, mesmo que nos mantivemos entretidos trabalhando, lavando roupa e visitando a cidade.
Em Tbilisi fizemos uma visita a Concessionária da Land Rover, pois precisávamos fazer manutenções. Além da bomba de direção hidráulica que havia estourado, uma bucha da cruzeta do cardam dianteiro partiu, danificando também o cardam, fazendo-nos ter que substitui-lo. Passamos um dia na mecânica e o Lobo saiu pronto para rodar mais alguns milhares de quilômetros.
Viajar por um longo período no Hemisfério Norte tem como consequência o frio. O inverno de 2016 na Rússia foi planejado e tínhamos um grande objetivo para nos manter motivados – a Latitude 70. Mas um segundo inverno se aproximava e isso não nos deixava contentes. Era certo que em algum lugar teríamos que enfrenta-lo e acabou sendo nessa região. Mas ali, ao contrário do Extremo Leste da Rússia, nossos dias estavam sendo nublados e chuvosos. Muito desanimador! Nosso corpo suplicava por vitamina D. Confessamos à vocês que numa ação de desespero cogitamos até fugir: abandonaríamos o Lobo num estacionamento e pegaríamos o primeiro avião para uma ilha paradisíaca com sol e calor, onde pudéssemos aproveitar a vida ao ar livre e voltaríamos somente quando as temperaturas (de -18C a noite e -9C de dia, sem sol!) estivessem mais amenas. Que golpe sujo estaríamos dando em nosso querido companheiro Lobo da Estrada. Assim seria fácil encarar o mundo, abandonando tudo e voando para outro lugar quando a situação apertasse. Não, de jeito nenhum! Acordamos daquele transe e colocamos nossos pés no chão novamente. Nossa decisão foi de enfrentar até o fim o que nos propusemos nessa segunda volta ao mundo e esse inverno não seria o maior desafio em nosso caminho até então. Deixamos Tbilisi dirigindo, rumo a região dos vinhedos.
A história do vinho é milenar e supõem-se que sua origem está nos atuais territórios da Geórgia, Armênia, Turquia ou Irã. Os indícios mais antigos estão na Geórgia, onde jarros de vinho de 8.000 anos foram descobertos. Não é por menos que a vinicultura é fundamental na economia desse país e uma tradição muito forte. No interior, quase todas as casas possuem parreiras de uva em seu jardim e o vinho caseiro faz parte das refeições diárias. Boa parte da produção do vinho é feita pelo meio tradicional chamado qvevri, ou seja, como o vinho era produzido desde a sua invenção. A uva é prensada e o suco, com a casca e o bagaço, são armazenados dentro de grandes vasos de barro, que são enterrados por seis meses para a fermentação. O vinho é filtrado naturalmente por decantação. Os resíduos que se acumulam no fundo são destilados e resultam num conhaque chamado chacha, que é o queridinho dos locais.
Ali visitamos Sighnaghi, uma das vilas mais lindas da Geórgia. Fica no alto de uma montanha, tendo a frente o vale Alazani ou vale dos vinhedos e ao fundo o imponente paredão do Grande Cáucaso. Infelizmente não era a temporada ideal para realizarmos caminhadas e não pudemos explorar a fundo a região. Mas descobrimos que a melhor forma de enfrentar o frio era mantendo-nos em movimento, então, sem demoras, seguimos para o Azerbaijão.
Na fronteira, uma notícia inesperada. Carros mais velhos que 2005 (o ano do Lobo é 2004), que consequentemente não se enquadram na regulamentação de emissões e segurança Euro 5, recebem apenas uma autorização de trânsito de três dias, ou para permanecer mais tempo, a condição era a de deixar um depósito de USD 4.500,00. Puxa, que banho de agua fria. Tínhamos tantas expectativas para visitar esse país, esperamos sete dias pelo visto, pagamos por ele e quando chegamos na fronteira, essa surpresa. Mas o oficial foi prestativo e queria nos ajudar. Até ligou para seus superiores na capital para tentar uma autorização, mas foi negada. Então ele nos propôs uma solução: a de entrarmos com a autorização de trânsito de três dias e simplesmente ficarmos mais tempo. Isso resultaria numa penalidade de trinta e cinco dólares (se ficássemos num total de duas semanas), que deveria ser paga na saída do país. O valor era baixo e o oficial foi claro que não teríamos outros problemas, então decidimos encarar. Porém esse oficial estava desinformado, pois a lei havia mudado há pouco tempo e o valor da multa subiu para oitenta e cinco dólares independente do tempo extrapolado. Mesmo assim valeu a pena. Adoramos a experiência no Azerbaijão e contaremos um pouquinho dela na sequencia.
O caminho da fronteira até a capital Baku acompanhamos as montanhas do Grande Cáucaso e por três vezes deixamos a principal para dirigir por estradas nas montanhas que levavam a pequenas vilas acima dos 1.000m de altitude. As vilas foram Cars, Ilisu e Lahic e nas três encontramos uma vida bem rural. Eram formadas por pequenas chácaras e por lindas casas de pedra, tijolo e madeira. O uso de carroças era muito frequente, mas o carro mais usado no Azerbaijão é o Lada Samara, sem dúvida, e este colore as estradas com suas cores descoladas. Percebemos que ali, assim como nos dois países vizinhos, os homens dominam as ruas. Fazendo o que? Não sabemos. Talvez esperando a vida passar, ou em busca de oportunidades de negócio. Achamos os azerbaijanos os mais simpáticos da região do Cáucaso. Essa fama sempre foi dada aos georgianos, mas temos que ser sinceros que não conhecemos os georgianos simpáticos que tanto ouvimos falar. Talvez porque era inverno e as pessoas estivessem mais introspectivas.
Em Shaki visitamos dois palácios construídos pelo seu antigo reinado. Neles haviam pinturas cheias de detalhes, mas o grande diferencial eram os vitrais, que durante a tarde, com o reflexo do sol, coloriam as paredes dos ambientes. Os vitrais de Sabaka encontrados nos palácios de Shaki são uma verdadeira obra de arte. Milhares de pedaços de madeira, manualmente esculpidos, são montados apenas por encaixe, sem pregos ou cola. Por entre eles são encaixados os vidros coloridos que foram importados de Veneza e Murano, na Itália, durante a época das caravanas de comércio que cruzavam a região do atual Azerbaijão. Uma riqueza de detalhes de fazer cair o queixo.
Azerbaijão significa “A Terra do Fogo”. Dois terços de sua superfície é composta de depósitos de petróleo e gás natural. Os combustíveis fósseis são tão abundantes neste país, que no início do século 20 eles supriam metade do petróleo consumido no mundo e sua moderna capital foi construída as custas desses recursos. Mas bastou dirigirmos alguns quilômetros na Península de Absheron para vermos os danos que essa extração gera e quão contraditório pode ser esse mundo. De um lado ficava a península praticamente destruída pela extração petrolífera e de outro Baku, uma cidade linda e rica, que cresceu as custas dessa destruição.
Nós chegamos em Baku com frio e nevasca. Tivemos dois dias assim, mas como era melhor nos mantermos em movimento para espantar o frio, saímos para explora-la. Caminhamos por toda cidade, que se mostrou muito bonita e agradável e seus arredores estavam cheios de curiosidades.
Desde o século 13 já se tem registros de Marco Polo mencionando chamas naturais saindo da terra na Península de Absheron. O que acontece é que em certos lugares o gás se localiza muito próximo a superfície, causando vazamentos, então basta uma pequena faísca para uma chama quase eterna começar. Estivemos em um local onde há esse vazamento na lateral de um pequeno morro, o qual estava em chamas que queimavam incessantemente mesmo debaixo de neve e muito vento. Chamam-se chamas de Yanar Dag e estão acessas desde 1950, quando foram acidentalmente acesas por um pastor desavisado que acendeu um cigarro. Incrível mesmo esse fenômeno. Outro local com chamas eternas é o Templo do Fogo em Suraxani. Supõe-se que Zoroastro, o fundador do Zoroastrismo, nasceu no Azerbaijão. O fogo é um elemento muito venerado nessa religião e todos os templos possuem chamas queimando cem por cento do tempo.
Nossa visita a Baku terminou numa feirinha de Natal, o que achamos estranho, já que estávamos num país predominantemente muçulmano. Está aí a prova de que o Natal virou um evento de consumo e, não mais religioso.
Dirigindo ao sul tivemos mais curiosidades, agora em Gobustan. Primeiro na Reserva de Petroglifos, composta de mais de 6.000 inscrições rupestres que datam de 5.000 até 40.000 anos atrás. O museu do local é imperdível e nos deu uma aula de história. Depois visitamos mini-vulcões de lama, que na verdade são gêiseres em formato de vulcões em miniatura. Dos quase mil existentes no mundo, quatrocentos se encontram no Azerbaijão. Foi muito divertido visita-los, especialmente quando explodiam ao nosso lado, nos dando um banho de lodo.
Os dias em terras azeris passaram voando. Nossa impressão teria sido a melhor, se não fosse por um incidente um pouco antes da saída: uma parada policial. Sabíamos da fama dos policiais do Cáucaso, que inventam infrações para conseguir propina dos viajantes, mas nunca imaginamos que eles seriam tão descarados. Assim que nos viram, seus olhos viraram em cifras. Vieram atrás de nós, acionaram as sirenes e nos pararam para inventarem que estávamos acima da velocidade permitida. Como poderiam medir nossa velocidade, se quando cruzamos com eles escoltavam um casamento? O guarda pegou nossos documentos e os devolveria só se pagássemos cinquenta euros. Nós não amolecemos. Num momento da conversa, viramos as costas e dissemos que esperaríamos em nosso carro. Todos usam da mesma tática, pois isso se repetiu por mais duas vezes na Armênia. Primeiro são simpáticos e verificam os passaportes. Aí solicitam a carteira de motorista e pedem que o motorista saia do seu carro e se dirija ao carro deles, onde começam com o papo sujo. Por que não falam da infração em nossa janela? Eles tem receio de falar na frente de mais pessoas e de serem filmados. Numa das vezes nos recusamos de sair de nosso carro e na outra, na frente do guarda, anotamos a placa do carro deles. Mudaram de atitude rapidamente. Sai pra lá malandros! Nunca nos tiraram um tostão.
Entramos pela segunda vez na Geórgia apenas para transitarmos para a Armênia e para passarmos por uma região muito bonita que abriga quinze monastérios do Complexo Davit Gareja. Nós visitamos apenas dois deles, Lavra e Udabno, e contamos um pouco dessa experiência num post anterior (para acessa-lo, CLIQUE AQUI).
Chegamos na Armênia no dia 21/12, início do inverno. Logo percebemos que não era a melhor estação para visitarmos o país, pois foi ali que pegamos as temperaturas mais baixas de todo o Cáucaso. As estradas estavam cobertas de gelo e neve. Em países mais desenvolvidos a neve das estradas principais é removida para que o trânsito flua normalmente, mas na Armênia (a nosso parecer o país mais podre dos três visitados) isso quase não acontece. Imagina como estariam as estradas secundárias que davam acesso aos locais que pretendíamos visitar? Tivemos que rever nossos planos e decidimos seguir direto para a capital Ierevan, sem montanhas dessa vez, com paradas apenas para visitarmos dois monastérios milenares (Haghpat e Sanahin) e para apreciarmos a beleza do monte Aragats (4.095m), a maior montanha armênia, localizada no Pequeno Cáucaso.
A Armênia foi a primeira nação do mundo a adotar o cristianismo como religião de Estado, em 301, e por serem tão religiosos, achamos que esse seria um ótimo país para passarmos o Natal. Como presente nos demos três noites num hotel, com café da manhã incluso. Não poderíamos ter escolhido presente melhor. A capital Ierevan não possuía muitos atrativos e com o frio que fazia, ninguém aguentava por muito tempo nas ruas. Isso fez com que não nos sentimos tão mal ficando grande parte do dia relaxando no quarto quentinho do hotel. A Ceia de Natal celebramos na Taverna Yerevan, um restaurante tradicional armênio e o dia 25/12 foi típico de Hemisfério Norte, com neve e -5C. Agora, éramos somente nós celebrando o natal neste dia, pois os armênios celebram o natal no começo de janeiro. Para entender o porque disso, acessem esse POST.
Quarenta e cinco quilômetros ao sul da capital fica a vila Pokr Vedi, onde se situa mais um monastério, o Khor Virap (Monastério de St. Gregório), ao lado do qual acampamos por duas noites a espera do tempo abrir. Nossa esperança não era de vermos melhor o tal monastério, mas sim uma montanha por detrás dele, o Monte Ararat. Nós já havíamos visto essa linda montanha em nossa passagem pela Turquia (país onde ele se situa) na primeira volta ao mundo e agora estávamos do outro lado dela. Dizem que Pokr Vedi possui a melhor vista. Para darmos mais uma chance ao clima, dirigimos mais ao sul até o Cânion e Monastério de Noravank, mas quando voltamos, o Ararat ainda não havia se desvendado. Dos sete dias que ficamos na Armênia, cinco não enxergamos um palmo a nossa frente, pois estava fechado de neblina. Muitos lugares tiveram que ficar só na imaginação.
Cansados do frio, colocamos um novo lema para nossa viagem, de seguirmos “sempre atrás do sol!”. Passamos por diversos passes. O ponto mais alto foi na fronteira com a Geórgia, 2.167m de altitude. Foi curioso que assim que cruzamos a linha da fronteira, a neblina se dissipou. Não longe dali, chegamos em uma das maiores atrações da Geórgia – Vardzia.
Na metade do século 12, o Reinado da Geórgia estava ameaçado pela expansão do império mongol e como uma forma de proteger sua cultura, a rainha Tamar ordenou a construção de um monastério caverna que ficaria camuflado na encosta de um penhasco. Quando finalizado, o complexo possuía treze andares e 6.000 apartamentos para abrigar monges e refugiados das invasões e acredita-se que o único acesso era através de um túnel que iniciava no rio Mtkvari. A parte superior da montanha estava coberta por terraços de cultivo que possuíam um elaborado sistema de irrigação para suprir alimentos para os 50.000 habitantes.
A cidade sobreviveu aos mongóis, mas foi devastada por um terremoto em 1283. Dois terços foram destruídos e as partes mais sensíveis ficaram expostas na lateral da montanha. O monastério continuou suas atividades até o século 16, quando foi atacado e saqueado por persas. Atualmente a cidade é mais um museu do que um monastério, mas alguns monges voltaram a fixar residência nas cavernas.
Nós a exploramos por mais de 3h. Pirávamos só de pensar que ali se localizavam 400 quartos, quarto da rainha, sala de reuniões, 12 capelas, farmácia, 25 adegas, igreja principal e torre do sino, refeitório, padaria, fornos, túneis, sistema canalizado de água e provisões para defesa. Uma cidade completa. Andando pelas escadas nevadas, tivemos a sensação de estarmos dentro de uma ilustração de Escher.
Do outro lado do vale, menos preservado mas não menos impressionante, localizam-se os Monastérios de Vanis Qvabebi, que antecedem Vardzia em 400 anos. Do lado direito as cavernas estavam abandonadas, mas somavam 16 andares. Do lado esquerdo, a parte mais baixa e acessível estava sendo habitada por monges e o único sinal de vida era a fumaça saindo das chaminés. Subimos por escadas externas e internas de madeira e terminamos numa capela lá no alto, com uma vista surreal do vale e de Vardzia do outro lado.
E veio o Ano Novo, o qual celebramos acampados num estacionamento na cidade de Borjomi, que atrai muitos visitantes por suas águas minerais muito saudáveis. O objeto mais cobiçado ali era a garrafa de plástico vazia, vendida em lojinhas de souvenir, para que as pessoas pudessem levar um pouco da água terapêutica para casa. Nós também cuidamos de nossa saúde e engarrafamos cinco litros daquela água horrível, salgada e com gosto de enxofre. Esperamos que, pelo menos, tenha sido para o bem. Antes da virada, jantamos no restaurante Bergi uma deliciosa truta ao molho de ameixa, acompanhada de berinjela e espinafre com pasta de amêndoas e vinho branco. Hum! A meia noite assistimos ao breves fogos de artificio do hotel ao lado do estacionamento que estávamos e capotamos para uma merecida noite de sono.
Seguindo o nosso novo lema, rumamos para a costa do Mar Negro e no caminho aconteceu uma coincidência muito legal: a latitude em que estávamos coincidiu com a longitude e conseguimos registrar esse momento no GPS (41° 45’ 34” N, 41° 45’ 34” E). Será que isso vai se repetir algum dia?
Batumi foi o último destino na região do Cáucaso. É uma cidade moderna, bonita, situada as margens do Mar Negro. O que gostamos de lá foram as ruas dos varais. Por falta de espaço para pendurar roupas, os locais desenvolveram um tipo de varal que cruza as ruelas, presos a mastros de ferro com roldanas. As roupas são penduradas de cada apartamento, em diversos níveis e algumas ficavam a 15 ou 20 metros de altura. Esse dia de sol terminou no alto de uma montanha, onde subimos de teleférico, com uma vista linda do Mar Negro e das montanhas do Cáucaso. De lá nós também enxergávamos nosso próximo destino, a Turquia. E para lá fomos no outro dia, “sempre atrás do sol!”
Para saber mais sobre esse trajeto, veja os posts a seguir:
- Cinco países de um só lugar? Será?;
- Feliz 2017!!!;
- 7 de janeiro, é Natal outra vez!!! Viajando e descobrindo…
Itinerário percorrido
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