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Diário de Bordo 50 – Montenegro, Bósnia e Herzegovina, Croácia, Eslovênia e Sérvia

(02/03/2017 a 31/03/2017)

Os mais jovens, provavelmente, pouco ouviram falar. Mas quem frequentou a escola antes de 2003 ainda estudou o mapa do mundo com o país Iugoslávia fazendo parte dele. Ele se extinguiu em 2003, mas perdurou por grande parte do século 20. Sua história se resume no que segue: começou após a Primeira Guerra Mundial (1918) com o nome de Reino dos Sérvios, Croatas e Eslovenos. Em 1929 passou a se chamar Reino da Iugoslávia. Durante a Segunda Guerra Mundial foi libertado do domínio nazista pelos chamados partisans, um grupo guerrilheiro comunista liderado por Josip Broz Tito. Tito, um ano após a abolição da monarquia, que aconteceu em 1945, se tornou presidente e governou até 1980, ano de sua morte. Ainda em 1945 o nome do país mudou para República Popular Federativa da Iugoslávia. Em 1963 foi rebatizada República Socialista Federal da Iugoslávia. Ao longo desses anos o país conquistou outras terras, tanto que antes de seu declínio, que iniciou quando Tito faleceu, a Iugoslávia constituía da República Socialista (RS) da Bósnia-Herzegovina, RS da Croácia, RS da Macedônia, RS de Montenegro, RS da Eslovênia e a RS da Sérvia. A RS da Sérvia constituía ainda as províncias autônomas de Vojvodina e Kosovo. Em 1992 quatro das seis repúblicas (Eslovênia, Croácia, Macedônia e Bósnia-Herzegovina) deixaram o país para formarem estados independentes, o que resultou em uma das guerras mais sangrentas da Europa após a Segunda Guerra Mundial. Em seguida as duas repúblicas restantes, Sérvia e Montenegro, formaram a República Federal da Iugoslávia. Em 2003 o nome Iugoslávia deixou de existir e a união da Sérvia e Montenegro usou esse mesmo nome, Sérvia e Montenegro. Em 2006 Montenegro se tornou independente e em 2008 Kosovo conquistou a independência da Sérvia. Em praticamente toda a sua história, a sede de governo da Iugoslávia localizava-se na Sérvia. O nome Iugoslávia significa “eslavos do sul”.

Falando em Sérvia, este sempre foi um país europeu de grande poder político e que influenciou diversos acontecimentos do século 20. Foi um sérvio que disparou o tiro que iniciou a Primeira Guerra Mundial. Aconteceu em Sarajevo (capital da Bósnia e Herzegovina) e a bala disparada matou o príncipe do Império Austro-húngaro. A Tríplice Aliança que compunha o Império Austro-húngaro, Alemanha e Império Otomano (atual Turquia) declarou guerra contra a Sérvia, que, por sua vez, foi apoiada pela Tríplice Entente, composta pelo Império Russo, França e Reino Unido.

Deixando a história de lado, queremos falar um pouco sobre nossa experiência viajando por lá. A Macedônia e Kosovo, países que também faziam parte da Iugoslávia ficarão de fora deste relato, pois sobre a Macedônia já escrevemos em um diário anterior e o Kosovo não visitamos. Nosso itinerário foi: Montenegro, Bósnia e Herzegovina, Croácia, Eslovênia e Sérvia. Apesar de que todos faziam parte de um só país até pouco tempo atrás, eles são muito distintos. Mas as montanhas dos Alpes Dináricos e o Mar Adriático são belezas em comum de quase todos.

Entramos em Montenegro e fomos conhecer o Lago Skadar, sobre o qual corre a linha imaginária que divide Montenegro da Albânia. Subimos uma montanha bem alta de onde, de um lado, avistávamos o Mar Adriático e do outro, este lago entre as montanhas dos Alpes Dináricos. O lago foi uma ótima pedida para relaxar. Montamos a canoa, desempacotamos o equipamento de pesca que há tempo não via água e fomos pescar, ou melhor, molhar o anzol. Este lago possui várias ilhas e numa delas foi construído um monastério que está em funcionamento nos dias atuais. A região possui vilas tradicionais com casarões quadrados protegidos por muros de pedra. Havia bastante agricultura e carneiros e as pessoas, fora os monges, sorriam quando passávamos. Os monges, que a verdade seja dita, nunca foram muito simpáticos.

De lá cruzamos as montanhas e fomos visitar algumas cidades da costa do Mar Adriático como Sveti Stefan, Budva e Kotor. Devido as montanhas nascerem praticamente no mar, há pouco espaço para as vilas desenvolverem-se, então elas foram construídas meio amontoadas, com estradas e passagens estreitas. No verão essas ruelas devem virar um caos, mas talvez sejam elas que dão um charme especial ao lugar.

Kotor é a principal atração de Montenegro. Situa-se no final da Baía de Kotor, que está rodeada por montanhas rochosas muito altas e bonitas. Quanto mais se sobe as montanhas, mais se percebe o quão elas são altas. Para se ter uma ideia, em 17 quilômetros apenas, dirigimos do nível do mar até 1.651 metros de altitude. Lá no alto está o Parque Nacional Lovcen e no cume de uma das montanhas há um mausoléu com uma vista espetacular. Nós deduzimos que (naquela fase da empolgação, pois não temos prova disso) em dia limpo é possível enxergar os países Montenegro, Albânia, Kosovo, Sérvia, Croácia, Bósnia e Herzegovina e, com muita sorte, a Itália, que situa-se do outro lado do Mar Adriático. A cidade Kotor é bonita não só por sua localização, mas pela arquitetura da cidade antiga, que é toda muralhada e cheia de labirintos. Ela possui também um castelo na montanha, a uns 300 metros acima da cidade. Perast, também localizada na costa da Baía de Kotor é um charme a parte. Pequenina, possui 16 igrejas, todas construídas em pedra. A arquitetura da região sofreu influencia dos venezianos que a dominaram por algum tempo.

Cruzamos então para a Bósnia e Herzegovina, um país que gostamos muito, especialmente a capital Sarajevo. Visitando Sarajevo pudemos vivenciar através de fotos e relatos um pouco da saga que esta cidade sofreu no começo dos anos 90, na Guerra da Iugoslávia. Imaginem que nos anos 80 ela cedeu as Olimpíadas de Inverno e hospedou esportistas e espectadores do mundo todo e no começo da próxima década ficou completamente ilhada, cercada pelos inimigos, sendo metralhada dia e noite por quase quatro anos. Nós escrevemos um pouco dessa história em um POST que fizemos recentemente. Clique aqui para acessa-lo.

A Bósnia é o país mais pobre da antiga Iugoslávia. Isso ficou perceptível nas estradas, vilas, casas e na própria capital Sarajevo, que não conseguiu apagar as marcas da guerra. Os prédios da periferia ainda estão picados de buracos de bala.

Entender os motivos da Guerra da Iugoslávia é quase impossível. Eis um exemplo: em determinado momento do conflito, bósnios-muçulmanos e croatas lutavam lado a lado contra os bósnios-sérvios, sérvios e montenegrinos. Porem, em 1993, um desentendimento surgiu entre os aliados (bósnios-muçulmanos e croatas) e estes passaram a lutar entre si. Qualquer diferença étnica, social ou religiosa virou motivo de guerra. Comenta-se que Mostar (Bósnia), de tão destruída que ficou, parecia-se com Dresden (Alemanha), após a Segunda Guerra Mundial. A ponte em arco que era conhecida mundialmente, construída em 1557 e que sobrevivera inclusive a invasão italiana na Segunda Guerra Mundial, caiu 427 anos mais tarde, em 1995, fruto desse conflito. Após o cessar fogo, Mostar foi reconstruída com apoio internacional, inclusive sua ponte, que voltou a ser um dos lugares mais visitados do país.

Próximo da lista da antiga Iugoslávia foi a Croácia. É o país mais turístico da costa do Mar Adriático, tendo uma extensa costa e 1.244 ilhas. Dá para acreditar? Isso sem contar as lindas montanhas, lagos, cachoeiras e as cidades medievais muralhadas como Dubrovnik, que no quesito charme, ainda está para ser construída uma cidade que se iguale a ela. Mas quando entramos suas muralhas por um dos portões principais, percebemos que os croatas também carregam mágoas da guerra. Através de uma placa informativa eles enfatizavam para os turistas estrangeiros os pontos que a cidade sofrera com bombardeios. É aquela história, para brigar, é preciso pelo menos dois. Ali envolveu cinco e hoje cada um quer defender o seu lado e jogar a responsabilidade das destruições para o outro.

Passamos por Split e Trogir, outras cidades medievais e nos despedimos da costa para conhecermos o Parque Nacional dos Lagos de Plitvice, que possui quedas d’água diferenciadas. Trata-se de uma concentração de cachoeiras de água cristalina que escoa por um vale profundo. Mesmo que era baixa estação, dividimos as passarelas sobre a água com muitos outros turistas, a maioria chineses, os quais sempre víamos em grupos e aparentemente eram muito animados.

Quando entramos na Eslovênia, tudo mudou. É um país pequeno, com apenas dois milhões de habitantes. Mas não são nas pequenas embalagens que se encontram as coisas boas da vida? A Eslovênia é assim. Um dos países mais verdes (proporcionalmente) do mundo, com um braço dos Alpes (Alpes Julianos) adentrando em suas terras. Um capricho de Deus, mas que os eslovenos resolveram mantê-lo bem cuidado assim como lhes foi entregue essa terra. Nos pareceu que os homens faziam uma espécie de competição nas vilas do interior, de quem cortava e empilhava a lenha com mais perfeição. O lixo que até então fazia parte das paradas ao lado da estrada nos países anteriores, desaparecera por completo. Se não tivéssemos aprendido nos livros, jamais diríamos que este país fez parte da Iugoslávia. Ele está muito mais para a Áustria e Suíça.

Um dos destaques da nossa passagem pela Eslovênia foi o Vale do rio Soca. Ele é verde, rodeado por montanhas altas e nevadas e a cor da água do rio, sem comentários. Em uma parte, onde o rio esculpiu sua passagem na rocha, de tão clara a água, podíamos enxergar do alto as trutas nadando contra a correnteza. Vimos também lagos muito bonitos, especialmente quando refletiam a paisagem ao seu redor como o lago Bled, o mais conhecido, porem, achamos o local muito turístico. E o que mais gostamos foi seu vizinho, o lago Bohinj, onde a natureza foi a maior atração.

A capital Liubliana conhecemos no dia certo. Era sexta-feira e o sol e o calor trouxeram muita gente para as ruas. No seu centro histórico não são permitido carros, então os bancos e as pontes do rio de águas verde-esmeralda ficam livres para os pedestres. Naquele dia estava acontecendo um festival gourmet na praça, com muitas barracas vendendo diferentes tipos de comida. Claro que não perdemos a oportunidade de almoçarmos junto a multidão, com uma cerveja na mão. Na praça onde esse evento estava sendo realizado, voluntários universitários vestidos com roupa de gari trabalhavam junto aos latões de lixo, orientando cada participante do evento como deveria separar o lixo. Um belo exemplo para o mundo.

Uma viagem é feita de experiências, tanto que as nossas impressões dos países que visitamos podem ser muito diferentes das de outros viajantes. Usamos como exemplo a Sérvia, que foi um país que nos recebeu muito bem. Achamos os sérvios parecidos com os brasileiros em alguns aspectos. Eles possuem interesses parecidos com nossos, tem os problemas políticos que temos e etc. E tudo isso, em nossa opinião, favorece nas amizades. Nós fizemos muitos amigos na Sérvia e tudo começou em uma oficina de Land Rover, onde fazíamos manutenção em nosso carro. Um cidadão se aproximou, pois se interessou pelo que fazíamos. Falou com outro, que nos convidou para nos reencontrarmos e a notícia se espalhou. No tempo que ficamos lá, praticamente todos os dias estávamos com algum amigo sérvio. Eles nos levaram pela capital Belgrado para conhecermos os principais pontos de interesse e para experimentarmos as comidas típicas, fizemos trilhas off-road, jantamos um peixe delicioso as margens do Rio Danúbio, fizemos churrasco sérvio e bebemos muita, mas muita cerveja e rakia, a aguardente local feita comumente de ameixa. Momentos muito agradáveis, que nos fizeram sentir saudades desses amigos logo que tivemos que partir.

E assim terminamos mais uma fase de nossa viagem. Da Sérvia nós seguimos em direção a Romênia, um país que há tempo desejávamos conhecer. A terra da Transilvânia, do Conde Drácula e dos castelos e vilas medievais.

 

Veja mais dessa região nos posts a seguir:

 

Itinerário percorrido

Itinerário Iugoslávia

Fotos

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